Por Sérgio Viana
Foto: Divulgação
Praça da República.
Aproximadamente 15 minutos para as duas da tarde. Muita, muita gente - jovens,
adolescentes, garotas, caras, hippies, rappers, metaleiros – lotam as ruas. Se
inflamam diante do palco ou simplesmente assistem às apresentações de braços
cruzados, balancê de cabeças, sentados sob uma sombra que amenize o calor.
Com uma carona garantida para as
14:30 decido não ficar até o final. “Acho que já deu pra mim”. Desço à estação do
metrô. Mais fria, barulhenta e lotada do que lá fora.
Dá pra perceber que muita gente,
como eu, não mora na capital pela fila enorme da bilheteria de passagens
avulsas. Tenho meu cartão “Bilhete Único”, porque a pouco tempo tinha tido
minha temporada acinzentada naquela cidade. Mas prossigo na fila dos comuns por
achar que seria chato recarregar só 3 reais sem ter troco.
Impossível não se contaminar com
toda energia paulistana. Uma fila pode ser um cigarro ou um maço inteiro, que
permite pensar na vida de modo mais amplo, tirando um pouco a atenção dos
probleminhas mais triviais.
Começo a entrar numa euforia
contida, numa vontade de não ir mais embora, de curtir aquilo ao meu modo,
único e só, até o final. A Virada me virou.
Saco o celular: “Fulana, vou
ficar. Beleza? Beijo”. Mensagem enviada. Logo respondida. Minha carona já era.
Já que fico mais um pouco, saio
da fila gigantesca que só tinha mais duas pessoas a minha frente e me decido
pela recarga do bilhete. Já que eu nem sei bem pra onde vou.
Não era a primeira vez que
entrava naquela estação, mas já fazia um tempo. Devido ao funcionamento de uma
nova linha ela passou por reformas. Ampliaram o espaço e a confusão.
Observei um fluxo contínuo e percebi que devia ser por ali.
Ainda um pouco desnorteado, fui
abordado por uma pequena senhora, acho que um metro e meio e olhe lá, mais de
sessenta anos, sacolas na mão, óculos garrafais, que ela os tirou ao falar
comigo fazendo com que seus olhos diminuíssem sensivelmente de tamanho. Tão
perdida quanto eu, ela pergunta ofegante: “Moço, você sabe de que lado é o
embarque?”. Vacilando na certeza... acho que é pra cá.
“Nossa, eles mudaram tudo aqui,
tá muito diferente e tão lotado. Obrigada, viu? Agora eu já me viro”.
Penso que ousei ao dispensar a
carona e para me precaver rumo antes à rodoviária pra garantir passagem. No
intervalo das estações até o destino me esqueço de todo o rebuliço da
superfície de São Paulo e fico imaginando, viajando, criando, quem seria aquela
senhora.
Afinal de contas, para muita
gente aquele era só mais um domingo. Dia de trabalho, de visitar um parente,
talvez da pequena senhorinha ver o sobrinho ou uma amiga de décadas que mora no
centro. E que ao chegar a hora de ir pra casa se depara com as ruas tomadas,
talvez sem fazer a menor ideia do porque aquilo está acontecendo. A Virada
nunca será de todos.
É bom demais poder aproveitar um
pouco de tantas apresentações, ouvir tanta música, assistir espetáculos em
lugares diferentes, ver tanta gente, tanta diferença, num lugar só. Mas também
é valioso demais perceber que por mais diferenças que se unam, outras vão
surgir, vão ficar mais a vista.
Na madrugada, caras de sono de
quem estava ‘virando’ se confundiam com o pouco descanso de quem saía cedo de
casa pra lida. Barzinhos, cuja especialidade é o salgadinho do preço, lotados
exibindo o último show do DVD enquanto do outro lado da rua um palco vibra ao
vivo. Gente apressada para não perder a sua atração principal, gente querendo
garantir a passagem de volta, a fuga do Acabou, e senhorinhas domingueiras que
só querem chegar logo em casa na tarde de domingo.
Eu espero que ela tenha
conseguido embarcar com tranquilidade, que muitos tenham conseguido assistir ao
show preferido, que vários folguem na segunda pra compensar a rotina malfadada
e que haja a diferença pra se fazer observar. Que isso nunca acabe.
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