“Eu tenho medo do descontrole do vício” - Entrevista com Dom Black

21 de agosto de 2012
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                                                                                                              Por Keytyane Medeiros




Toco a campainha da sede o Ponto de Cultura Acesso Hip Hop pela quarta vez em menos de duas semanas e imediatamente penso que o simpático Felipe Canela – que sempre me recebeu muito bem - já deve ter cansado da minha cara. É bem provável. Lá em cima, o rapper e também aspirante a documentarista, Dom Black me aguarda. Super prestativo e bem humorado, Dom Black me recebeu em nome da equipe do e-Colab para falar um pouco mais sobre o processo de produção do documentário realizado em parceria com Thigor MC, outro importante músico de Bauru. O filme intitulado “A Praga Do Século” funciona como uma extensão de uma canção homônima da dupla e assim como a música, fala sobre o crack, a depredação pessoal gerada pelo uso e, sobretudo, indica que os usuários podem se livrar da dependência química e retornar a uma vida saudável e próxima de seus familiares. Ouça “A Praga Do Século” aqui.


e-Colab: Qual o objetivo principal do documentário “A Praga Do Século”?
Dom Black: O objetivo é conscientizar a molecada a não se envolver com drogas, e também mostrar a realidade do usuário e da família dele. Todo mundo pensa “ah, ele é nóia” e eu penso que ele [o usuário] não é isso, e sim um cara doente que está passando por um momento difícil. O consumo de crack é um problema que a sociedade tem que se mobilizar para resolver.


e-Colab: E por que a opção de estender esse tema para um documentário, se vocês já haviam tratado do assunto na canção “A Praga Do Século”?
Dom Black: Nós achamos que seria pouco só cantar esses problemas da droga, porque algumas pessoas ouvem, acham legal, entendem, mas acabou por ali. Não fazem mais nada além de ouvir a música. Já vi muita gente fazendo rap, cantando os problemas e isso faz bem, mas podemos fazer alguma coisa a mais, podemos ir e mostrar como é realmente. Uma coisa é a pessoa ouvir, a outra é ela ver e entender o que está acontecendo a partir da voz de outros usuários que conhecem a droga, que fumam e que sabem como ela age.


e-Colab: Ao contrário de canções que em geral falam da maconha e das bebidas, por que você escolheu falar justamente do crack no seu projeto? 
Dom Black: Em primeiro lugar, porque eu tive problemas com parentes próximos que se tornaram usuários e então eu vi essas pessoas ficarem fora de si. Eu acho que todas as outras drogas, a bebida, a maconha, são a porta de entrada dos vícios e eu tenho medo do descontrole do vício. Não só do vício nas drogas, mas em qualquer coisa.


 e-Colab: E na sua opinião, por que o consumo de crack têm crescido em Bauru e nas outras cidades do interior do Brasil? 
Dom Black: Crack é barato e vicia rápido. O traficante sabe que vai ter sempre aquele usuário que vai comprar a pedra uma vez e vai retornar atrás de outra. Entre as drogas, o crack é a única que te pega de uma vez só. Acho que só a heroína, que é injetável faz isso também.


 e-Colab: Como a temática da droga e dos usuários está sendo tratada no documentário? 
Dom Black: As pessoas não tem dimensão da delicadeza do problema. Queremos mostrar as coisas do jeito são mesmo, desde o familiar que não sabe como lidar até o usuário que quer sair do vício, mas não sabe como fazer isso. Na maioria das vezes, o usuário quer sair, mas não sabe a quem recorrer, e também o usuário em recuperação que sabe que vai ter que lutar contra a dependência química a vida inteira, e outras situações. Não quero formar a opinião de ninguém, eu quero que as pessoas vejam e tirem suas próprias conclusões sobre o crack e sobre os usuários.


e-Colab: Como está sendo o processo de produção e quais as dificuldades de gravar “A praga do século”? 
Dom Black: Tá sendo difícil. Nem todo mundo quer falar abertamente sobre isso, alguns têm medo que patrão descubra que o individuo já foi usuário vai tratá-lo diferente, e coisas assim. Têm muita gente ajudando, mas é difícil por causa do dinheiro também, do deslocamento dos materiais até os locais de filmagem... É complicado, mas está sendo gratificante. A gente tá vendo a melhora de muitas pessoas e sabemos que quando o documentário sair vai abrir a mente de muita gente sobre o crack e sobre os usuários.

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Com três meses de produção, Dom Black conta que “A Praga Do Século” ainda não tem data de lançamento definida, mas pela conversa que tive com esse experiente músico e artista bauruense, posso garantir: uma boa obra de denúncia social está por vir. Bauru, assim como o Brasil, precisa compreender que não dá mais para ignorar o efeito devastador do crack, e que ele deve ser tratado urgentemente como uma questão de saúde pública.

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