Tem cal nesse samba

9 de outubro de 2012
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Por Keytyane Medeiros
Fotos: Arquivo Pessoal/Silo Sotil


Desde que li “O Cortiço” nada e nem ninguém me tira da cabeça que domingo é dia de samba. Mas samba mesmo, de raiz; com pandeiro, viola e gente dançando ao redor. E a cada dia é mais difícil ver essa cena, principalmente se você não mora nas proximidades do bairro de Anhangabaú em São Paulo, ou em Campinas. Explico: em São Paulo, o bairro central costuma receber vários artistas em seus barzinhos durante os fins de semana, um esquema parecido acontece na cidade do interior paulista.

Em Campinas, Casa Caiada é um desses grupos que alegra os fins de semana da cidade, mas para eles, se apresentar em casas de show nunca foi um apenas um hobbie. Sempre foi um trabalho, mas mais do que isso, o samba para eles é estilo de vida.

Silo Sotil, vocalista do Casa, conta que o grupo surgiu da necessidade de criar um grupo para a manutenção do projeto “Escuta o Cheiro” da prefeitura de Campinas. Deu tão certo que em outubro o grupo completa quatro anos. O nome curioso tem a ver com a identidade musical do grupo, que segundo eles mesmos, é “bastante crua e verdadeira”, na tentativa de diminuir a necessidade de retoques artificiais no trabalho final, tal qual os velhos sambas de roda.


O primeiro CD da banda, está recheado de arranjos tradicionais, mas em suas letras, o grupo destrói alguns estereótipos recorrentes no samba. Um exemplo disso é a canção Malandro Honesto. Apesar do trecho “sou dono de mim, faço o que quero, vou onde desejo, não tenho compromisso, nem levanto cedo. Só quando acaba a grana é que eu arranjo emprego”, a música narra a história de um homem que faz o que quer, mas não precisa sacanear ninguém para isso, paga suas dívidas e cumpre o que promete, mas o seu único defeito é gostar da vida.

Outra canção anti-estereótipos é Fora de sim, já que além de culpar a moça por não ser mais capaz de amar, a personagem da música toma uma decisão contrária à que muitos sambistas e sertanejos normalmente tomam, se recusando a tentar uma reconciliação.

Silo diz que detesta estereótipos, “já se foi o tempo em que ser malandro, ficar dando golpe em gente honesta, ou gastar tudo em cachaça (não que eu não gaste um pouco...). Acho que a importância de se compor é justamente a oportunidade de recriar, retratar o momento.”. Para ele, a realidade social do Brasil é diferente da época dos grandes compositores brasileiros, como Cartola, Noel Rosa ou Wilson Batista e isso acaba influenciando a composição das músicas e das ideias passadas através delas. “O malandro honesto é o típico exemplo de um retrato de um cara que não gosta de fazer o que não gosta, mas nem por isso precisa roubar ou extorquir.”

A banda passou por várias alterações ao longo de sua existência, mas influência do samba de roda, samba clássico nunca saiu de cena na vida dos artistas do Casa Caiada. Artistas como Nelson Cavaquinho, Mestre Candeia, João Nogueira e músicas de roda compõem o repertório cultural do grupo. Silo ainda reforça a autonomia criativa da turma de Campinas, “é fundamental que se conheça samba para se fazer samba, mas não precisamos necessariamente repetir um monte de coisa que já foi dita.”.

Certos que de “nossa realidade política nos roubou muito dinheiro e romantismo”, o Casa Caiada traz para a nossa vida hiperconectada, fechada em paredes do quarto e à base do ar-condicinado, toda a leveza das rodas de samba não-televisionadas. 


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