"Neguinho o caralho, meu nome é Emicida, porra!"

15 de maio de 2014
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Texto: Keytyane Medeiros
Imagens: Pedro Fávero



Mesa de 2 pickups, berimbau e cavaquinho numa quarta-feira a noite. E é noite de show do Emicida no Sesc Bauru. As arquibancadas estavam lotadas de fãs e novos-fãs ansiosos pela apresentação. Foi bonito de ver, tinha gente de todo tipo, desde aqueles que não sabiam cantar mais do que duas músicas, mas se envolviam com as batidas até aqueles que sabiam letras de Xis e DMN, rappers importantes da década de 1990 e que foram incluídos no repertório do cantor do Jd. Fontalis. 

Mas antes de falarmos do Emicida propriamente, temos que falar da banda. Depois de ontem, penso até que poderia ser, daqui pra frente, Emicida e Banda, porque a multiplicidade de instrumentos e suas combinações foi um show à parte. A guitarrista e backing vocal se destacou (ainda mais, já que era a única mulher no palco) quando puxou um som no berimbau, somado aos beats do DJ Nyack e à percussão muito bem delineada ao fundo. Os músicos se entregaram e passaram a energia de samba, rap e africa-brasilidades para o público. Isso me lembra que em 2013, Emicida deu uma entrevista à Noize em que dizia que estava experimentando novas texturas, novos ritmos e a escolha por uma banda tão eclética e alinhada, prova que essa experimentação tem dado certo. 

Emicida a todo tempo puxava o público e pedia por sua participação. Ao cantar “Triunfo” numa versão diferente da original, surpreendeu e trouxe a vibe de show de rap pro Sesc. A partir daí, foi “Rua Augusta”, “Eu gosto dela”, “Emicidio” e tantos outros sucessos dos EPs anteriores tomando conta da quadra. Mas foi o primeiro álbum oficial do rapper, “O Glorioso Retorno de Quem Nunca Esteve Aqui” a grande estrela do show. “Hino Vira-Lata”, “Bang!” e “Hoje Cedo” estavam na boca do povo, mostrando que o rap ultrapassou, ao longo dos últimos anos, barreiras até mesmo históricas de preconceito com o gênero. 

“Axé pra quem é de axé, pra chegar bem vilão, independente da sua fé, música é nossa religião”. Essa foi Ubuntu Fristilli, música que reproduz e amplia o que o africano Desmond Tutu já definiu como filosofia Ubuntu: “uma pessoa com ubuntu está aberta e disponível aos outros, não-preocupada em julgar os outros como bons ou maus, e tem consciência de que faz parte de algo maior e que é tão diminuída quanto seus semelhantes que são diminuídos ou humilhados, torturados ou oprimidos.” 

No meio do show, Emicida convidou Renan Inquérito ao palco e mais uma vez, o MC de Campinas começou a vender pó, pó-esia até não sair mais do palco. Ficou ali, compondo o show, recitando e cantando vários sucessos do rap nacional junto à Emicida: Sabotage, DMN, Doctors Mc, Xis. Estouro. 



Quem acompanha o movimento Hip Hop sabe que, em quase todos os shows de rap, existe um momento Freestyle. Rappers são rimadores convictos, às vezes mandam bem, às vezes mandam mal, mas esse momento é sagrado para um MC e para os fãs de rap. Ontem não foi diferente, ainda mais pra Emicida, cria da Rinha dos MCs da Santa Cruz e de tantas outras das periferias de São Paulo. Só com os beats do DJ Nyack, Emicida convidou Coruja BC1, expoente do rap bauruense, para mandar umas rimas e tocar corações. Senti o chão tremer quando o Corujinha da Rima subiu ao palco, sempre reforçando a ideia de que “se o interior tem voz, o mundo vai ter que ouvir”.

Pois é, o Sesc e toda uma diversidade de bauruenses ouviu. Ouviram a homenagem de Emicida ao mestre Jair Rodrigues, ouviram uma aula de rap nacional, de cultura e identidade negra e periférica. Ouviram de amor e de rinha. De pertencimento e orgulho. Ouviram pó e do chão, fortaleceram o Hip Hop com suas vozes e com seu coração.



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